domingo, 15 de setembro de 2013

Perigosa Intolerância


Recentemente, em “Avenida Brasil” – brilhante novela
de João Emanuel Carneiro – era possível acompanhar uma
trama que unia dois homens e uma mulher, e outra que
abordava o casamento entre um homem e três mulheres.
Neste segundo caso, com direito a vestidos nas noivas e
beijos enfileirados lado a lado. Esse fato não provocou o
menor alvoroço na sociedade como causa a manifestação
de afeto entre duas pessoas do mesmo sexo.
Paradoxalmente, por algum critério de moralismo seletivo,
o tal “beijo gay” ainda continua sendo um tabu.
Sou casado há 17 anos. Uma relação pública abençoada
por toda nossa família. É importante ressaltar que
casamento civil nada tem a ver com nenhuma cerimônia
religiosa. A definição de casamento, segundo o Código
Civil, art. 1511: “O casamento estabelece comunhão plena
de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos
cônjuges”.
Por que, afinal, as pessoas querem se casar? Porque
em nosso país cidadãos que se unem para dividir uma vida
em comum só têm a ampla proteção, em direitos e
deveres, se realizado o casamento civil, estabelecido no
Código Civil. O ministro Luiz Felipe Salomão, do STJ, em
decisão sobre casamento civil, declarou em seu voto: “Com
efeito, se é verdade que o casamento civil é a forma pela
qual o Estado melhor protege a família, e sendo múltiplos
os ‘arranjos’ familiares reconhecidos pela Carta Magna,
não há de ser negada essa via a nenhuma família que por
ela optar, independentemente da orientação sexual dos
partícipes, uma vez que as famílias constituídas por pares
homoafetivos possuem os mesmos núcleos, a dignidade
das pessoas de seus membros e o afeto”.
No último dia 6, a coluna de um jornalista noticiou que
uma conversão de união estável em casamento entre duas
pessoas do mesmo sexo na cidade fluminense de Sapucaia
deve sofrer represália de um grupo religioso que promete
uma passeata contra a união e já roda um abaixo‐assinado
para tentar anular a decisão. É muito perigoso esse nível
de intolerância e interferência na vida dos outros que tem
acontecido no Brasil. Pessoas têm se unido para fazer com
que as regras da sua religião sejam impostas à sociedade,
mesmo aos que não comungam de sua fé.
Reconheço que não vejo a comunidade judaica
organizar‐se para impor suas regras e viabilizar um projeto
de lei que proíba o consumo de carne de porco no país ou
para que tenhamos de respeitar o shabat. Não vejo a
comunidade muçulmana se organizar para criar uma lei
onde todos têm de se ajoelhar para Meca ao meio‐dia. Por
que então algumas pessoas “em nome” de determinadas
religiões tentam impor seu Deus e suas regras a toda uma
sociedade? Não preciso ser negro para lutar contra o
racismo. Não preciso ser judeu para lutar contra o
antissemitismo. E você não precisa ser homossexual para
lutar contra a homofobia.
(Carlos Tufvesson. O Globo)

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